Excertos de Éros e magie à la Renaissance, publicado pela Flammarion em 1984.
Proposta de estudo do estatuto da imaginação na Renascença e as modificações que afetarão na época a Reforma protestante; registro de concepções de uma era fantástica, seu apogeu e seu declínio. Análise da magia, definida como ciência do imaginário, através da teoria dos filósofos neoplatônicos como Pico della Mirandola, Marsilio Ficino e Giordano Bruno. Traça-se assim um retrato do mago do Renascimento, “o grande manipulador”.
A magia em seu grau mais elevado de desenvolvimento é um método de controle do indivíduo e das massas fundado sobre um conhecimento profundo das pulsões eróticas pessoais e coletivas. Tudo pode ser manipulado pela imaginação.
A Reforma e em seguida a Contra-Reforma impõem com sucesso uma censura radical do imaginário que conseguirá eliminar a magia. Esta censura permitirá, segundo Couliano, a aparição da ciência exata e da técnica moderna.
Um prefácio de Mircea Eliade sublinha “a novidade e a originalidade” das interpretações de Couliano.
Introdução
Pensa-se ainda que um abismo separa a visão do mundo de nossos contemporâneos e nós mesmos daquela do homem do Renascimento. A masrca visível desta fratura seria a tecnologia atual, fruto da “ciência quantitativa”, que se desenvolve a partir do século XVII.
Seria difícil sustentar que o método da magia tem algo a ver com o método de nossas ciências da natureza. No entanto, a magia tem de comum com a tecnologia moderna, a tentativa de obter resultados, por outros meios: comunicação à distância, transportes rápidos, viagens interplanetárias, também eram interesses do mago.
Em princípio, a magia que será aqui estudada é uma ciência do imaginário, que ela explora por meios que lhe são próprios e que ela pretende manipular a sua vontade. Em seu mais alto grau de desenvolvimento, em Giordano Bruno, a magia é um método de controle do indivíduo e das massas, baseado em um conhecimento profundo das pulsões eróticas pessoais e coletivas.
As operações fantásticas que conhece o Renascimento são mais ou menos complexas: o eros é a primeira operação que se manifesta já na natureza, sem intervenção da vontade humana. A magia é apenas um eros aplicado, dirigido, provocado pelo operador, embora hajam outros aspectos como manipulação de fantasmas, a arte da memória, etc.
Estudando a imaginação do Renascimento e as modificações as quais elas será submetida na época da Reforma, fazemos, de algum modo, obra de pioneiro.
Na obra de Paul K. Feyerabend encontramos confirmações de ordem histórica. Esta se baseou nos estudos de Max Weber sobre a o nascimento da ciência moderna. Sobretudo Robert K. Merton reconhece um “deslocamento de interesses vocacionais” para ciência, na Inglaterra puritana. Este puritanismo que se fundamentará à formação do “espírito do capitalismo”, como assegura Weber. Couliano expande estas reflexões, com críticas especialmente a Feyerabend, e afirmando acompanhar finalmente o pensamento de Max Weber.
Embora tenhamos a nossa disposição uma ciência e uma tecnologia avançadas, perdemos em relação ao Renascimento as faculdades de operar nossos fantasmas e de outros, e nossa capacidade de dominar nossos próprios processos imaginários se reduziu a nada.
Examinando a relação do homem do Renascimento com seus próprios fantasmas, e as razões ideológicas que imprimiram a evolução desta relação, pode nos levar ao entendimento e à justa compreensão das origens da ciência moderna.
Excertos: