HULIN (PEPIC) – AHAMKARA

MICHEL HULIN — O PRINCÍPIO DO EGO NO PENSAMENTO INDIANO CLÁSSICO

Um dos mais compreensivos livros sobre o pensamento indiano tomando como eixo de estudo a questão do “ego” no pensamento indiano clássico — ahamkara (PEPIC).

A questão da individuação é uma daquelas que acompanham a metafísica ocidental no curso inteiro de sua história. Objeto de admiração para os Pré-socráticos, pedra de tropeço para a teoria platônica das Ideias, ela encontra sua “solução” clássica em Aristóteles, graças à intervenção do par matéria-forma. Transmitida pela escolástica medieval, ela ressurge na monadologia de Leibniz e se mantém no plano de fundo dos debates de filosofia biológica mais contemporânea. Ora, toda esta linhagem de pensadores buscou somente fundar, de modo positivo, a individualidade do vivente em geral como condição de possibilidade da verdadeira personalidade, aquela do sujeito humano. Quando um Schopenhauer, ao contrário, fala do *principium individuationis*, entende denunciar uma forma de ilusão metafísica: aquela que nos faz perceber o absoluto — para ele a Vontade — objetivado e dispersado na multitude dos organismos viventes com suas necessidades e desejos particulares. Mas pode ser que Schopenhauer, no contrapé de uma longa tradição de afirmação e de justificação da Pessoa, tenha ficado prisioneiro desta tradição. Quero dizer por isto que a Pessoa poderia ter sido refutada em sua existência real, e isso sob diferentes formas de sujeito moral, indivíduo, alma criada, etc., sem no entanto se fazer o objeto de uma colocação em questão ao nível da determinação de sua essência. Se esta hipótese se verificasse, esclareceria o famoso pessimismo de ou niilismo do autor. Se verdadeiramente, por uma necessidade de essência, a Vontade não se faz fenômeno para nós senão sob a forma desta tensão dolorosa pela qual, de um mesmo movimento, o sujeito se constitui em centro de referência autônomo, constitui seus semelhantes como tais e se opõe a eles, enquanto a cessação radical da dor (a distinguir de sua suspensão temporária) passa pela dissolução da individualidade ela mesma, com seus poderes de ação, de conhecimento e de alegria. Mas é dos Upanixades e do budismo que Schopenhauer pretendia tirar o essencial de sua doutrina. Assim, involuntariamente, contribuiu para enraizar no ocidente — e até nossos dias — o preconceito segundo o qual as soteriologias indianas não fariam senão traduzir um fuga diante das tarefas e conflitos da existência, se referenciariam ao «pessimismo da fraqueza» (Nietzsche), sacrificariam toda alegria, e mesmo toda forma de consciência, ao desparecimento da dor, ergueriam, sob o nome de *nirvana*, a queda no nada em fim último do homem.

A NOÇÃO DE AHAMKARA

INTRODUÇÃO

PRIMEIRA PARTE — O ATMAN E A EMERGÊNCIA DO PROBLEMA DA INDIVIDUAÇÃO I O atman e a revelação védica

- Do espaço cósmico ao espaço do coração

- O surgimento do mundo e a formação do ego

II O budismo e a negação do atman

- Os elementos

- A verdade dos elementos

III A reação bramânica e seus limites

- A consciência de si segundo a Mimamsa

- Paixão e desapego segundo o Samkhya-yoga

- O eu subsistência do Nyaya-Vaisesika

- Persistência das objeções budistas: o Tattvasamgraha

SEGUNDA PARTE — IGNORÂNCIA METAFÍSICA E INDIVIDUAÇÃO SEGUNDO O ADVAITA I Sankara: Ambiguidades da sobreposição

- Questões de terminologia

- Gênese da individualidade

- A perspectiva da liberação

II As primeiras construções sistemáticas

- A. Padmapada

O estatuto ontológico da nesciência

- Os níveis da consciência de si

- B. Mandanamishra

- C. Sureshvara

III Controvérsias e trocas de influências no Advaita tardio

- A. A escola de Vivarana e a ilusão cósmica

O aporte de Prakasatman

- Bharatitirtha: o espelho do ego e a dupla criação

- B. As doutrinas subjetivistas

Vacaspatimishra e a questão do lugar da ilusão

- Sarvajnatman e o solipsismo transcendental

Conclusão

TERCEIRA PARTE — A NOÇÃO DE PURNAHAMTA NO XIVAÍSMO DE CAXEMIRA I Os fundamentos metafísicos

- A generosidade do absoluto: o spanda

- A gênese da servidão

II Experiência afetiva e experiência mística

- Surpresa e confusão: a reconquista do instante

- Alegria, dor, deslumbramento

III Experiência estética e desindividualização

- Fusão das consciências

- Sabores poéticos e sabor do brahman

Conclusão